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Percorreu as TVs com a filha porque ela estava morrendo. Agora é acusada de assassiná-la

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“Esta é a história de uma doce princesinha que todos chegaram a amar”. Assim começava em 2015 a apresentação de um site de arrecadação de fundos para ajudar Olivia Gant, então com quatro anos, cujas múltiplas doenças eram incuráveis. Mas a história, de acordo com a polícia do Colorado, está mais para a de uma mãe que simulou que a filha mais nova tinha várias doenças fatais para causar pena, se aproveitar dela e, por fim, deixá-la morrer.

Kelly Renee Turner, de 41 anos, foi presa na sexta-feira em um hotel ao sul de Denver. É acusada de 13 crimes, incluindo assassinato, abuso infantil, roubo, fraude em obras beneficentes e falsificação. O comunicado de imprensa do xerife diz que se trata de um caso “extremamente emotivo” para os agentes. A pequena Olivia Gant se tornara uma celebridade local no Colorado e uma de suas paixões era a polícia.

Em abril de 2017, uma história local de Denver tocou os corações de todo o país. Uma menina de seis anos com uma doença terminal havia escrito uma lista de aventuras que queria realizar antes de morrer. Entre elas estava “perseguir os maus” com a polícia. Então, o Departamento de Polícia de Denver cumpriu seu desejo. Deram-lhe um uniforme, levaram-na em uma patrulha e a nomearam chefa de polícia honorária por um dia. Saiu nas emissoras de TV. No noticiário do Denver Post daquele dia, a mãe, Kelly Turner, dizia: “Não sabemos quanto tempo lhe resta”.

Dois meses antes, uma entidade beneficente tinha conseguido realizar outro sonho de Olivia. Organizou uma festa na qual ela se fantasiou de “Bat Princesa” e pôde lutar contra bandidos de mentirinha. A festa custou mais de 11.000 dólares (cerca de 45.000 reais) arrecadados com doações. A história saiu na CBS local. TVs também reportaram que Olivia passeou com os bombeiros, outro sonho de sua lista.

Kelly Turner dizia que a filha sofria de uma doença chamada encefalomiopatia neurogastrointestinal. Para o tratamento médico criou uma página no GoFundMe, uma plataforma que atende pessoas que pedem dinheiro. De acordo com os termos da acusação, chegou a arrecadar mais de 20.000 dólares (81.000 reais) para Olivia. A página, chamada Peace4Olivia, não está mais disponível. O cachê do Google indica que foi criada em 27 de julho de 2015 e o rastreamento de mensagens no Facebook mostra que Turner começou a anunciar as supostas doenças da filha mais nova em 2011, quando ela estava com 13 meses.

A acusação não especifica o motivo da morte de Olivia Gant. A investigação relata uma série de entrevistas com 11 médicos que afirmam que a menina não estava em estado terminal e que a mãe não deveria ter retirado o tratamento médico dela. Em agosto de 2017, a mãe ordenou que os médicos parassem de alimentar Olivia através de uma sonda, em teoria, para que ela pudesse morrer em paz, devido à sua má qualidade de vida. Ela estava recebendo cuidados paliativos, supostamente por uma disfunção intestinal, quando morreu em 20 de agosto.

Um dos médicos interrogados na investigação declarou que Turner lhe disse que a filha estava rejeitando a nutrição por sonda, algo que não acontece, explica a denúncia. Ele recomendou que a dependência da sonda fosse retirada pouco a pouco, mas a mãe se negou e também ordenou que não tentassem ressuscitar a menina. Outro médico explicou que nenhum dos diagnósticos de Olivia era terminal e que não havia necessidade de retirar a alimentação. As doenças de Olivia eram em parte reais, em parte inventadas. Um dos médicos se declarou “em choque” quando soube que a mãe havia retirado o tratamento e que Olivia tinha morrido. Todos os médicos questionados declaram que não era de modo algum um caso terminal e que a mãe rejeitou todos os tratamentos alternativos propostos. O seguro público Medicaid gastou 538.000 dólares (2,17 milhões de reais) nos tratamentos de Olivia.

Kelly Turner Gant, mãe de Olivia Gant, na foto policial.

A investigação do caso só começou em outubro de 2018, depois que Turner levou a filha mais velha ao Hospital Infantil de Denver, dizendo que tinha uma dor nos ossos. Segundo ela, a menina havia tido câncer e fora tratada no Texas, antes de se mudarem para o Colorado em busca de melhores tratamentos para ela e para Olivia, deixando o pai no outro Estado. O médico que a viu suspeitou da história e telefonou para médicos no Texas, que lhe informaram que a menina nunca teve câncer. Quando o fato foi comunicado ao Departamento de Serviços Sociais, os investigadores começaram a revisar as informações de Kelly Turner nas redes sociais sobre supostas doenças que sua filha, na realidade, não tinha. Foi então que ligaram as pontas e se deram conta de que a filha mais nova, Olivia, havia morrido no ano anterior. Os médicos disseram aos investigadores que temiam que Turner tivesse falsificado relatórios sobre as doenças da filha e a submetido a tratamentos desnecessários.

Em 28 de novembro de 2018, os restos mortais de Olivia foram exumados como parte da investigação. O médico legista fez uma autópsia, mas relatou que não havia como determinar disfunções intestinais nem nenhuma outra doença que Turner disse que a filha tinha. Declarou que não poderia estabelecer a causa da morte.

Na acusação está assinalado que Turner, interrogada pelos agentes, disse espontaneamente que não se tratava de uma síndrome de Munchausen. A chamada síndrome de Munchausen por procuração é uma doença mental. É quando uma pessoa que cuida de uma criança inventa doenças e lhe provoca sintomas. Ninguém perguntou a Turner sobre isso quando ela disse: “Esse nunca foi o meu caso, de jeito nenhum. Você pode perguntar a qualquer um que esteve ao meu lado em … tudo isto”. No final, Turner admitiu ter inventado as doenças da filha mais velha. Ainda não confessou nada sobre Olivia, de acordo com a denúncia.

El País

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