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Agenda da água: os desafios para garantir segurança hídrica a todos até 2030

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Entre 22 e 24 de março de 2023, foi realizada a Conferência da Água da Organização das Nações Unidas (ONU) na sede da organização em Nova York. O objetivo central dessa conferência foi o estabelecimento de um plano de ação para o alcance do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 6 (ODS6), que consiste em tornar a água potável e o saneamento um direito humano para todas as pessoas até 2030.

Foram necessários 46 anos para que o tema água liderasse novamente, por alguns dias, a agenda mundial, em eventos que reuniram representantes de governos, da sociedade civil e do setor privado. A última Conferência das Nações Unidas sobre água havia sido realizada na Argentina, em 1977. De lá para cá, a população mundial quase dobrou, assim como o uso de água por setores como a indústria, agricultura e de produção animal. Já o uso para o consumo doméstico triplicou na média global. Essa espera de quase meio século para recolocar a água no topo da agenda de ações globais pode ter contribuído para aumentar o custo social, ambiental e econômico relacionado à degradação e disponibilidade de água de boa qualidade.

O último relatório de progresso da ONU sobre a água indica que um quinto das bacias hidrográficas do mundo está passando por mudanças rápidas, desde inundações e terras alagadas até a secagem de lagos e áreas úmidas, além da deterioração da qualidade da água. Por um lado, atividades humanas, como a construção de barragens, a agricultura e a mineração, intensificaram a mudança dos ecossistemas de água doce e dos padrões hidrológicos. Além disso, as águas residuais, que incluem as de uso doméstico e o escoamento agrícola e industrial, são a principal causa de poluição de corpos de água, pois cerca de 80% das águas residuais globais não recebem tratamento, segundo o relatório.

Por outro lado, as mudanças climáticas afetam a segurança hídrica devido à ocorrência de eventos climáticos extremos mais frequentes, como inundações, secas e tempestades que, conjuntamente, respondem por mais de 75% dos desastres naturais, de acordo com o relatório da ONU sobre o valor da água.

A população urbana global que enfrenta a escassez de água está projetada para aumentar de 933 milhões em 2016 para aproximadamente 2 bilhões de pessoas em 2050, e mais da metade da população mundial já sofre com a escassez durante uma parte do ano. Dois bilhões de pessoas bebem água contaminada por esgoto. Mais de um bilhão de pessoas estão em risco de contágio da cólera. No Brasil, nos vinte municípios com pior condições gerais de saneamento, segundo estudo do Instituto Trata Brasil que considerou os 100 municípios mais populosos do país, em média apenas 29% dos habitantes recebem serviço de coleta de esgoto e 18% têm acesso à água tratada.

A perda ou degradação dos ecossistemas de água doce pelas atividades humanas afeta também a biodiversidade. Cerca de um terço das espécies de peixes de água doce estão sob risco de extinção e uma boa parte dessa ameaça está associada à poluição das águas ou perda de habitats. Além do mais, a qualidade e a disponibilidade da água também estão entrelaçadas com o aquecimento global, cada um reforçando o outro, o que também leva à perda de biodiversidade.

Em 2015, o mundo se comprometeu com o ODS 6 como parte da Agenda 2030. O ODS 6 compreende 11 indicadores diferentes usados para medir o progresso global em direção à meta, incluindo água potável, saneamento e higiene, águas residuais, gestão de água e ecossistemas. No entanto, a maioria das metas do ODS 6 correm o risco de não serem alcançadas até 2030.

Por exemplo, em 2020, 26% da população mundial não tinha acesso a serviços de água potável gerenciados com segurança (meta 6.1 do ODS) e 46% não tinham acesso a saneamento gerenciado com segurança (meta 6.2 do ODS). Além disso, os indicadores necessários para rastrear a proteção e restauração dos ecossistemas relacionados à água ao longo do tempo (meta 6.6 do ODS) ainda não foram refinados. No ritmo atual, os governos precisam trabalhar em média quatro vezes mais rápido para cumprir o ODS 6 no prazo, mas essa não é uma situação que eles possam resolver sozinhos.

As SbN, em geral preventivas, diminuem a erosão e o carreamento de solo e, consequentemente o assoreamento de rios, lagos e represas. Auxiliam ainda na penetração lenta de água no solo, o que pode contribuir para a manutenção do lençol freático, mesmo no período de estiagem, impedindo que rios sequem. As SbN podem também apresentar um papel mitigador, como a introdução controlada de vegetação aquática que absorve determinados tipos de contaminantes presentes na água.

No entanto, a segurança hídrica é sobretudo uma questão social e, nesse contexto, negociações e decisões sobre a água devem considerar equidade e inclusão. A escassez hídrica crônica e a baixa qualidade da água comprometem o crescimento econômico e a produção de alimentos e assolam sobretudo países ou regiões de renda média e baixa, e afetam os mais vulneráveis ou marginalizados.

Em média, segundo o relatório da ONU, “10% da população global vive em países com estresse hídrico alto ou crítico”. No Brasil, as seis capitais estaduais com menor IDH (Maceió, Macapá, Porto Velho, Belém, Rio Branco e Manaus) entre todas as capitais do país estão entre os vinte piores municípios no ranking do saneamento de 2023 do Instituto Trata Brasil. Dessa forma, gestão e governança hídrica adequadas devem capturar o real valor social da água e sua conexão com a equidade, justiça e direitos humanos.

Entretanto, um dos maiores resultados da Conferência foi o direcionamento de medidas sob a perspectiva de que a água é um bem comum, em geral não restrita a limites geográficos, e de que é necessária a integração de esforços em nível global na busca de soluções de segurança hídrica, em vez dos atuais mecanismos financeiros e de governança fragmentados. Resta saber se os mais de 700 compromissos voluntários de gestão hídrica e suporte financeiro procedentes de governos, empresas e organizações não-governamentais serão efetivamente cumpridos.

Fonte: Revista Galileu

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