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Top 5 de coisas que já nasceram gays (e só precisaram aceitar)

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O homem é um ser simbólico. Mas antes de cometer a ousadia de criar uma lista para caracterizar símbolos, precisamos entender por quê isso é importante; ou, para ser ainda mais específico, por quê isso é necessário. A contemporaneidade trouxe o privilégio da problematização; essa “permissão conquistada” para começar a falar sobre tantos assuntos que antes eram esmagados pelo tradicionalismo e pela hesitação. É esse privilégio que nos faz questionar por quês, que levanta prós e contras de tantos mecanismos sociais e culturais que perpetuamos através da história do mundo. A palavra de ordem é liberdade. Então, por que ainda buscamos a referência?

Talvez a resposta mais simples seja: buscamos a referência porque somos seres sociais e é a partir da identificação que nos agrupamos. É um processo inerente à existência. Precisamos – e queremos – estar com outras pessoas, encontrar nosso lugar, dividir experiências e nos conectar a partir delas.

A cultura tem uma parte essencial nesse processo. Eu escrevo sobre cultura pop. Você está aqui porque consome cultura pop. E nós todos sabemos muito bem o tanto que a cultura nos fascina e nos rege. Se tem um indivíduo movido a elementos culturais, é o fã de cultura pop, o nerd, o geek, a pseudo versão de ambos e os agrupadores de tudo que é arte. A gente se junta com quem gosta dos mesmos filmes, das mesmas séries, dos mesmos quadrinhos… A gente se constrói e se desmonta a partir disso, porque, enfim, tudo pra gente é símbolo. Tudo que nos cerca é símbolo. E sobretudo para grupos sociais que foram impedidos de viver essa vida livremente, a simbologia é um conforto existencial. Ao lado de quem compartilha dela, você está seguro.

A absorção de simbologias tem por natureza a apropriação. Geralmente objetos, obras, lugares e até palavras, são “sequestrados” por determinado grupo social e com o tempo, tem seu sentido modificado. A palavra gay, enfim, era usada no passado histórico remoto para designar coisas alegres. Através das décadas ela teve alguns outros sentidos atribuídos, mas passou a ser usada com mais força para se referir a homossexuais a partir dos anos 50. E essa palavra é só um ponto de um vasto catálogo de itens que se tornaram parte da iconologia gay. E é sobre alguns desses – que já nasceram gays – que esse texto vai falar.

A luta e o sonho de todos nós é que uma sociedade feliz seja possível sem que ninguém precise se agrupar para se defender; e sim se agrupar para compartilhar. Não é o ideal que haja pelo mundo um bocado de “coisas gays” e de “coisas heteros”; que listas como essa celebrem aquilo que foi permitido atribuir à comunidade, ou simplesmente elenque aqueles que são – também – símbolos de segregação e dor.

Mas, não estamos lá ainda; e no final dessa leitura talvez seja possível entender por que é tão importante reconhecer o que foi feito para o mundo, mas que nasceu para ser nosso.

A MÚSICA QUE JÁ NASCEU GAY…

… sem dúvida foi o Pop. Podemos dizer que Aretha Franklin, Donna Summer, Diana Ross e Gloria Gaynor foram algumas das grandes cantoras que acabaram influenciando na criação do que podemos chamar hoje de “divas pop”. O gênero não tinha nenhuma intenção de estar tão atrelado ao universo gay, mas a admiração por figuras femininas fortes é uma inerência da comunidade. É fácil entender por que… O mundo heteronormativo é geralmente opressor para os gays e muito cedo o caminho natural é o de se aproximar das mulheres, geralmente mais acolhedoras e maduras.

Junte-se a isso a maneira como essas estrelas da música se exibiam com extravagância, soberania, alimentando a ideia de uma figura talentosa, mas mordaz, igualmente petulante. Cher pode ser sido aquela que estabeleceu a cartilha para todas as que circulam pelo mercado fonográfico nos dias de hoje. Madonna é a mais bem-sucedida, mas depois dela formou-se um séquito de deusas que sustentam o olimpo do pop. Lady Gaga, Katy Perry, Rihanna, Britney Spears, Xtina, Kylie, Ariana, Beyoncé… As divas pop refletem a força, inspiram a arte, confortam com melodia e desafiam com o corpo. Não é todo homem gay que curte, mas os que curtem sabem exatamente como é bom compartilhar dessa paixão.

O CINEMA QUE JÁ NASCEU GAY…

… nasceu dos musicais. É interessante notar como o alvo da clássica Hollywood quando começou a lançar filmes musicais era a plateia masculina (com Marilyn Monroe seduzindo com sua voz de veludo) e as crianças (com Walt Disney decidindo que seus personagens também iriam cantar). O Mágico de Oz, de 1939, não foi o primeiro filme do gênero, mas talvez seja aquele que será lembrado primeiro. E o que tínhamos nele? Uma protagonista cantante, bruxas, mágicos, um sapato fabuloso e um mundo colorido e fantástico. E essa noção do que é fantástico na forma e real nos afetos, é o que pauta o gênero musical até hoje.

Recentemente, ao anunciar sua volta ao mundo de Sex And The CityKim Catrall publicou um print da notícia com a seguinte legenda: Happy Pride. Ela tinha a noção exata de que sua personagem na série falava diretamente com a audiência gay e que ela mesma, pessoalmente, era considerada uma diva. Portanto, principalmente a partir da década de 50, a cada novo musical, a cada nova versão de Barbra Streisend, os gays foram aqueles que perpetuaram o estilo e as referências, reproduzindo esses musicais em todas as outras formas, que não somente a cinematográfica. De lá até aqui.

E isso também acontece na televisão. Quem não se lembra da outra Oz? Aquela que se passava numa prisão violentíssima e que foi criada por Tom Fontana para chocar a audiência e atrair os homens interessados em tapas, socos e morte. Mas, acabou se tornando um sucesso entre os gays não só por causa dos constantes nus frontais, mas por conta da história de amor entre Tobias (Lee Tergensen) e Keller (Christopher Meloni). A série precisou dar a volta nos próprios intuitos e privilegiar seu inesperado público. The Last Of Us passou por um pouco disso esse ano, mas, como também costuma acontecer no mercado, no caso dela, a maior parte do público hetero quis impedir essas associações.

O BRINQUEDO QUE JÁ NASCEU GAY…

… foi a Barbie. Aliás, foi qualquer boneca que um dia já tenha sido “roubada” em segredo pelo menino que viu a irmã ser presenteada com uma. Mas, vamos dizer aqui que a Barbie é a mais emblemática, porque, enfim, ela é dona de uma outra apropriação simbólica que faz parte da iconologia gay até hoje: a cor rosa. A boneca atravessou o tempo como um exemplo perigoso da busca pela perfeição e juventude eternas; mas, com as mudanças midiáticas e sociais alcançadas nos últimos 10 anos, Miss Barbie foi abraçando a diversidade.

Contudo, não vamos esquecer que esse fenômeno acontece em outras áreas também. Na páscoa desse ano uma franquia de chocolates resolveu fazer uma campanha de ovos que vinham com brindes direcionados para o público infantil. Um deles era um ovo que acompanhava um Ursinho Carinhoso. Do anúncio à chegada dos ursinhos nas prateleiras, passou um segundo e eles já não eram encontrados para compra. A comunidade Bear acabou com os estoques do Brasil inteiro em dias. E é nas estantes desses ursos que foram parar os ursinhos de pelúcia.

O ESPORTE QUE JÁ NASCEU GAY…

CHARLY TRIBALLEAU / AFP

… espera! Podemos cometer a ousadia de dizer que um esporte “nasceu gay”? Aliás, usar a expressão “isso é muito gay”, denota, na maioria das vezes, algum tipo de estruturalismo homofóbico; sobretudo, porque, a frase geralmente está diminuindo a “seriedade” daquele elemento ao atribuí-lo à comunidade. Houve um tempo em que pensar em gays praticando esportes sem se esconderem em fachadas heteronormativas era praticamente impossível. Felizmente, isso está mudando.

Times organizados de futebol e volley já são comuns e não podemos deixar de mencionar que o Rugby passou a ser um dos esportes considerados mais gay-friendly do circuito. É curioso, visto que é um esporte de muito contato físico, quase sempre em campos de terra e que tem quase nenhuma beleza técnica. É uma escolha controversa e até mesmo provocativa, que ajuda a jogar por terra as obviedades do estereótipo.

Porém, assim como a rejeição aos grupos acaba formando outro grupo, a busca pela fuga do estereótipo cria outro. A heteronormatividade, infelizmente, é usada por parte da comunidade para estabelecer soberania sobre quem não se expressa da mesma maneira. Homens gays na posição ativa do sexo, sem traços de feminilidade, adeptos de esportes culturalmente atrelados à masculinidade, alimentam uma horrorosa dinâmica de superioridade comportamental; sem se darem conta, na maioria dos casos, que essa repulsa aos símbolos do feminino tem raízes na misoginia.

A COISA MAIS GAY QUE JÁ NASCEU GAY…

… é a moda. Basta fazer uma pequena lista mental de todos os estilistas mais famosos da história e a quantidade de nomes de homens gays será imensa. A razão para isso não é a mais bacana do mundo… Demorou muito tempo para que mulheres fossem aceitas em profissões que eram geralmente destinadas aos homens (mesmo que esses homens fossem gays). Muito provavelmente teríamos um equilíbrio muito maior se o machismo não fosse tão historicamente opressor. O fato é que a moda talvez seja a área em que os artistas gays encontraram mais possibilidades de expressão. E muito cedo.

Isso encosta naquele que é o símbolo de diversidade LGBTQIA+ mais forte do mundo: a bandeira do arco-íris. Criada em 1978 por encomenda do ativista Harvey Milk, pode ser vista em qualquer lugar do planeta estampando tecidos, acessórios, se refletindo em luzes e emoldurando postagens. Ela foi idealizada pelo artista Gilbert Baker e no início tinha oito faixas; cada uma representando algum valor existencial positivo: sexualidade, vida, cura, luz do sol, natureza, magia e arte, harmonia, espírito humano.

É providencial que essas cores falem tanto de harmonia e de afeto, porque, no mundo que está do lado de fora, ainda há quem lute para subtrair, extrair, impedir, evitar. Há lá fora quem lute para que “coisas gays” não existam nunca mais.

Então, sim… Enquanto for possível e enquanto tivermos voz, vamos festejar o “filme gay”, a “música gay”, a “celebridade gay”, o “esporte gay”, o dia gay… porque essa é uma das maneiras de impor nossas características, nossa fatia do globo, nosso direito à vida.

Você já viu alguma coisa gay hoje? Já ouviu alguma coisa gay hoje? Mesmo que você não seja, veja, ouça. Você vai perceber que as “coisas gays” são mais parecidas com as “outras coisas” do que você imagina. Coisas gays não fazem as pessoas se tornarem gays. Elas até transformam sim, mas é o coração.

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