Depois da megaoperação policial nos complexos da Penha e do Alemão, no dia 28 de outubro — a mais letal da história do Rio de Janeiro, com 121 mortos —, um novo desafio surgiu: garantir a segurança e o futuro dos dez adolescentes apreendidos durante a ação.
Eles estão sob acompanhamento dos conselhos tutelares da região, com apoio direto do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, que tenta evitar que esses jovens sejam vítimas de execuções, vinganças ou novo aliciamento pelo tráfico.
⚖️ O que vai acontecer com os adolescentes?
Os dez jovens seguem internados em uma unidade socioeducativa na Ilha do Governador, enquanto aguardam audiências de custódia, que devem ocorrer até o fim da semana.
Essas audiências vão definir se as apreensões foram legais e se eles podem responder em semiliberdade ou liberdade assistida, já que a maioria não tem antecedentes criminais.
De acordo com Lívia Vidal, coordenadora-geral da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o foco agora é garantir que eles sejam protegidos e acompanhados de perto, especialmente se forem soltos.
“Não ficando internados, a gente precisa que esses adolescentes estejam resguardados e protegidos, para não serem colocados em situação de ameaça”, explicou Lívia.
Ela também reforçou que, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a ressocialização é mais eficaz fora do sistema fechado, com apoio da escola e da comunidade.
🧠 Ações e proteção
Três medidas principais foram definidas pelos conselheiros tutelares e o governo federal:
- Reforçar a estrutura dos conselhos tutelares, para que consigam atuar com segurança e eficiência.
- Oferecer atendimento psicológico e médico às crianças e famílias afetadas pela operação, incluindo aquelas que perderam parentes.
- Acompanhar os dez adolescentes apreendidos e suas famílias, garantindo proteção e inclusão em programas como o PPCAM (Programa de Proteção à Criança e Adolescente Ameaçados de Morte).
O Ministério também prometeu criar uma rede de apoio emocional para os conselheiros, já que muitos estão sobrecarregados com o impacto psicológico das denúncias e dos atendimentos após a operação.
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🏚️ “Usaram nossa janela para atirar”
O relatório da Ouvidoria da Defensoria Pública do Rio de Janeiro revela o clima de terror vivido pelas famílias durante as 16 horas de confrontos.
Houve relatos de crianças sem aulas por três dias, casas invadidas, uso de gás de pimenta e até a prática da chamada “Tróia” — quando policiais entram em residências para emboscar suspeitos.
Um dos depoimentos mais chocantes é de uma mãe que presenciou tiroteios dentro de casa:
“Eles entraram e usaram nossa janela para atirar. Tem cápsulas de bala em cima da cama do meu filho. Atiraram com a gente dentro de casa. Meu filho só sabe gritar”, disse ao relatório.
Outro caso é o de uma mulher grávida, com duas crianças pequenas, que teve a casa destruída após um botijão de gás explodir. Ela ficou dois dias com sangramento sem conseguir atendimento.
👶 O ciclo da violência e o risco de repetir a história
A operação Contenção escancarou uma realidade antiga: adolescentes crescendo em meio à violência.
Em 2004, o documentário “Adolescência no Complexo da Penha” já mostrava jovens que evitavam sair de casa por medo de bala perdida.
“A vista da Igreja da Penha é linda, mas prefiro ficar em casa. Se for pra rua, não sei se volto”, dizia uma das adolescentes entrevistadas na época.
Vinte anos depois, o cenário pouco mudou. A juventude das favelas continua dividida entre o medo da polícia e o poder das facções — uma geração inteira aprendendo a sobreviver em meio ao fogo cruzado.
🔫 Tráfico ou trabalho infantil?
Um ponto importante levantado pelo Ministério dos Direitos Humanos é que o envolvimento de menores com o tráfico também é reconhecido como trabalho infantil pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Ou seja, esses jovens são vistos como vítimas de exploração, e não apenas como infratores.
“O tráfico é crime, mas também é uma forma de trabalho infantil, com jovens explorados por redes criminosas armadas”, destacou Vidal.
⚰️ Mortes, tortura e racismo
A Ouvidoria da Defensoria apontou que muitos corpos foram encontrados em áreas de mata, com sinais de tortura e execução.
Um em cada três mortos tinha menos de 25 anos, era preto ou pardo, e vivia nas comunidades afetadas.
O relatório descreve ainda que várias vítimas tinham cabelos pintados — vermelho ou branco —, uma marca estética comum entre jovens periféricos.
“Isso mostra um claro crime de racismo e de ódio, voltado à juventude negra das favelas”, afirma o documento.
📍 O que vem pela frente
Enquanto o governo discute as próximas ações, os conselhos tutelares tentam reconstruir a rotina das comunidades.
Entre o luto, a violência e o medo, o maior desafio é proteger os adolescentes sobreviventes da operação — para que o que restou da infância deles não seja também levado pelas balas.




